Mulher da noite
A cidade passa indiferente por ti,
És agora mais uma no corredor frio da noite,
Às vezes já do próprio dia na incerteza de cada noite,
E homens de olhar perdido no andar cinzento
Tomam-te como se tomassem um castelo,
Mas não é a ti que tomam os homens…
Eu sei que tu apagas a luz, a tua luz,
E escondes o coração na penumbra do leito
E assim o teu castelo fica a salvo,
Que isso a vida logo to ensinou…
Aliás, nem serão homens
Os que te tomam,
Serão apenas corpos, pedaços de corpos
Que no teu corpo entre gemidos e talvez risos,
Ou talvez choros,
(Choros que tu,
Acendendo a luz por momentos,
Sossegas então em colo e peito de mulher),
Os que te tomam serão, digo eu,
Os que querem esconder-se
Dos infortúnios dos combates dos homens
Na transitória ilusão de vitória…
Depois, mulher da noite,
Depois tu voltas a acender a luz
E já não és corpo, serás filha, serás mãe,
És mulher entre gente talvez vendida da cidade…
José Rodrigues Dias, Entre o Sono e o Sonho, Antologia de Poesia Contemporânea, vol. III, p. 275, Chiado Editora, 2012.
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