quarta-feira, 27 de maio de 2015

Sobreiros



Sobreiros


Gostaria que os homens fossem como os sobreiros,
Nas agruras resistentes, sempre sóbrios, em solos ardentes.
Gostaria que os homens ao quarto de século fossem jovens adultos
Como os sobreiros, com a cortiça virgem tirada dos troncos
Pela primeira vez descortiçados por mestres tiradores
Sem machados a cortarem as raízes e a seiva do crescimento.
Gostaria que os homens nos sobreiros, então, se olhassem
E no espelho do céu se repensassem no seu tronco nú,
Com a casca rugosa superficial tirada, reduzidos à sua essência,
À seiva que lhes dá a vida pelas raízes na secura da terra conquistada.
Gostaria, então, que os homens continuassem como os sobreiros,
Em nova etapa, com a força retemperada e, nove anos passados,
De novo descascados por hábeis mestres descortiçadores,
Com precisão no corte para de novo não os magoar no seu ser
Nem os ofender no essencial do seu viver e crescer.
Gostaria, então, que os homens olhassem de novo os sobreiros,
Maiores, continuando sóbrios no seu porte, verdadeiros,
E sentissem como leve continua a ser a cortiça secundeira
Que vento fraco matinal de quase aragem leva ligeira.
De tronco nú, gostaria que os homens neles de novo se mirassem
E em imagem de futuro com eles se reiniciassem
E de novo, em nova etapa, se fortificassem.
Gostaria, então, que os homens continuassem como os sobreiros
E que um dia, depois, nove anos depois, vissem como teria
Finalmente, então, qualidade a cortiça amadia.
E de novo em tronco nú, despojados da sua superficialidade,
Reduzidos à sua essência, em nova etapa iniciada,
Com mais porte e mais seiva, maiores, verdadeiros,
Gostaria que os homens olhassem agora os adultos sobreiros,
Imponentes, agarrados mais ao solo, ainda mais sóbrios.
Gostaria, assim, que os homens fossem como os sobreiros,
Crescendo, dando-se ao cuidar de mestres, aos outros se dando,
Olhando-se no espelho do céu, almejando o brilho das estrelas,
Libertando-se do superficial, o essencial preservando,
Como os sobreiros, imponentes no ser do tempo,
Olhando do seu alto a pequenez dos pequeninos chaparros
E o abocanhar sôfrego dos porquinhos.
Gostaria, então, que os homens fossem como os sobreiros
E que vissem como é até leve a cortiça amadia
Que um vento mais forte como colorido trapo superficial
Para um longe escuro leva para sempre,
Num qualquer dia!


José Rodrigues Dias, Traçados Sobre Nós, Chiado Editora, 2011, pp 69-71.

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