domingo, 21 de março de 2021

Sobreiros

 




Neste Dia Mundial da Poesia e também Dia Mundial da Árvore e da Floresta, o poema "Sobreiros", publicado em 2011, que gravei e coloquei no Youtube em 2016 (basta clicar na imagem acima).


O sobreiro é Árvore Nacional de Portugal.


*

Sobreiros

 

Gostaria que os homens fossem como os sobreiros,

Nas agruras resistentes, sempre sóbrios, em solos ardentes.

Gostaria que os homens ao quarto de século fossem jovens adultos

Como os sobreiros, com a cortiça virgem tirada dos troncos

Pela primeira vez descortiçados por mestres tiradores

Sem machados a cortarem as raízes e a seiva do crescimento.

Gostaria que os homens nos sobreiros, então, se olhassem

E no espelho do céu se repensassem no seu tronco nú,

Com a casca rugosa superficial tirada, reduzidos à sua essência,

À seiva que lhes dá a vida pelas raízes na secura da terra conquistada.

Gostaria, então, que os homens continuassem como os sobreiros,

Em nova etapa, com a força retemperada e, nove anos passados,

De novo descascados por hábeis mestres descortiçadores,

Com precisão no corte para de novo não os magoar no seu ser

Nem os ofender no essencial do seu viver e crescer.

Gostaria, então, que os homens olhassem de novo os sobreiros,

Maiores, continuando sóbrios no seu porte, verdadeiros,

E sentissem como leve continua a ser a cortiça secundeira

Que vento fraco matinal de quase aragem leva ligeira.

De tronco nú, gostaria que os homens neles de novo se mirassem

E em imagem de futuro com eles se reiniciassem

E de novo, em nova etapa, se fortificassem.

Gostaria, então, que os homens continuassem como os sobreiros

E que um dia, depois, nove anos depois, vissem como teria

Finalmente, então, qualidade a cortiça amadia.

E de novo em tronco nú, despojados da sua superficialidade,

Reduzidos à sua essência, em nova etapa iniciada,

Com mais porte e mais seiva, maiores, verdadeiros,

Gostaria que os homens olhassem agora os adultos sobreiros,

Imponentes, agarrados mais ao solo, ainda mais sóbrios.

Gostaria, assim, que os homens fossem como os sobreiros,

Crescendo, dando-se ao cuidar de mestres, aos outros se dando,

Olhando-se no espelho do céu, almejando o brilho das estrelas,

Libertando-se do superficial, o essencial preservando,

Como os sobreiros, imponentes no ser do tempo,

Olhando do seu alto a pequenez dos pequeninos chaparros

E o abocanhar sôfrego dos porquinhos.

Gostaria, então, que os homens fossem como os sobreiros

E que vissem como é até leve a cortiça amadia

Que um vento mais forte como colorido trapo superficial

Para um longe escuro leva para sempre,

Num qualquer dia!

 

in José Rodrigues Dias, Traçados Sobre Nós, 106 pp, 2011.



Jrd, 2021-03-21


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