De alfa e ómega
Aqui estou eu vendo-vos passar,
um ou outro cheirando a peixe
miúdo,
os outros a sal de saborear o
mar,
eu, uma pequena e pobre flor nascida
vendo enorme uma bola
nascendo lá no pinhal
sucumbindo depois engolida
pelo mar...
Nem querida nem amada,
eu, na vida aparecida
e por vós até espezinhada...
Um dia sou esta flor nascendo
vivendo cada dia, olhando a
bola grande,
um dia por fim aqui
morrendo...
Pois se até mesmo aquela
enorme bola
que de manhã no pinhal
rumorejando vejo nascer
pela tardinha no mar a vejo
desfalecer
e que depois no dia seguinte
outra bola, em tudo igual,
chamam-lhe sóis,
vai nascer e também morrer...
E morrer decerto como eu um dia,
por isso a vida
a vivo aqui tranquila sem
agonia...
E tu, que em mim reparaste
e que me olhas assim com esse
olhar de irmão,
que, pobre, de mim gostaste,
olha o nascer e o pôr de um
sol
mas arrefece no mar as
perguntas de alfa e ómega
e sente tranquilamente este
sul...
Sim, mas como, sem a amargura de fel
na crueza das dúvidas do caminho
e das mentiras,
como saberemos do doce sabor
do mel?...
2017-03-03
in José Rodrigues Dias, Poemas em tercetos simétricos, diarísticos (Janeiro a Março, 2017), Ed. Forinfor, 132 pp, 2017.
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Jrd, 2020-03-03
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