quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Futebol, um golo de Ronaldo

 


Futebol, um golo de Ronaldo


Não se sente um ruído

para além do ruído do computador,

o ruído já velho, puído...

 

Conheço-lhe o tempo,

minhas mãos o iniciaram, o encaminharam,

conheço o movimento...

 

Nem um ruído,

no largo em frente no jardim

tudo é silêncio...

 

Lá longe,

um golo de Ronaldo, rola

uma bola...

 

2018-06-20


in José Rodrigues Dias, Emanações do silêncio, 278 pp, 2019.


Jrd, 2020-09-09


terça-feira, 8 de setembro de 2020

Até onde eu andarei?

 



Até onde eu andarei?

 

 

Encontro-me entre versos, versos, versos…

Serão versos?

Poesia?

 

Perdi-me no tempo entre fórmulas e números

inebriado tantas vezes em tão inefável beleza

tão absolutamente sagrada, origem que era…,

que só alguns deuses e deusas assim a sentiam

em instantes de profunda reflexão concentrada…

E perdi-me também entre tantos bits e bytes

(como haveria aqui de os nomear?),

entre aqueles esqueléticos zeros e uns,

tão esqueléticos e tal a pureza em si que era…

Deixei marcas cinzeladas de vida nascida que senti

enquanto me marcava a sombra vaga de uma nuvem

correndo sobre o homem no chão

e a cor crescendo numa flor

e poder eu apenas então dizer

sim ou não,

apenas isso…,

ou não e sim

em absoluta disjunção,

assim tão, eu tão redutor

vendo a cor a crescer

de uma flor

ou a força

de uma dor…

 

Perder-me-ei de novo no tempo

neste outro encontro

fora de tempo?

Até onde eu andarei?

 

2013-01-15


in José Rodrigues Dias, Diário Poético (2012 - 2016), Livro três, 3/10 (Janeiro a Junho de 2013), 266 pp, 2020.


* * * 

Jrd, 2020-09-08

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

SNS, o teu poema perfeito



 

SNS, o teu poema perfeito

 

(Pequena homenagem a António Arnault,

obreiro do Serviço Nacional de Saúde)

 

 

Teu o poema perfeito

 

(em tempo: digo quase perfeito

por se ter no tempo retrocedido,

tu triste e magoado,

quase o poema ofendido…),

 

de ti em vela de sonho nascido

a régua e a esquadro

e aberto, bem aberto o compasso,

todos à ordem,

no horizonte largo,

 

poema verso a verso burilado

em cada letra soletrada em nova palavra

em chão matizado 

em lavra de solidariedade,

cada homem feito um irmão

qualquer que seja o seu género e a idade,

 

eis, mundo inteiro,

o poema,

eis a saúde

feita aqui universal

e do homem feito um direito,

ei-la, a saúde!

 

A saúde, ei-la

em liberdade!

 

E, assim, de ti

o poema justo e perfeito

na luz iniciado,

a constituição

livro primeiro sagrado!

 

De ti, poeta e obreiro de oriente,

o poema perfeito

(pelo tempo feito imperfeito)

no peito da gente,

 

o teu poema decerto preferido

verso a verso construído,

em cada verso um nome,

o nome de cada homem nascido,

 

não importando

quem é,

a quem pertence o sobrenome,

de que gente é o homem

que ali está dorido

como outro qualquer nascido,

 

apenas se indagando

com o coração

e as ferramentas na mão,

auscultando...

 

Senhor, onde lhe dói,

onde começou, quando, como foi,

onde é essa sua dor?

 

Senhor doutor, mas quanto será?

 

Será o que for,

senhor,

não importa o que custará,

será o que tiver que ser,

vamos é ver

essa dor

e outra precaver...

 

Senhor,

vamos lá ver

essa dor…



José Rodrigues Dias, 2014-09-15


(Poema a incluir num dos próximos livros)


Jrd, 2020-09-07


domingo, 6 de setembro de 2020

O belo da Natureza em apelo

 



O belo da Natureza em apelo

 

 

Do verde o ar leve de flor,

uma flor de branco suave aberta à luz do Sol

num céu pintado de azul…

 

É Setembro,

é o belo da Natureza em apelo

e é Domingo!

 


José Rodrigues Dias, 2020-09-06


sábado, 5 de setembro de 2020

Vaso com flores

 


Vaso com flores

 

(Sobre um fundo muito negro do palco

um branco frio iluminando à boca da cena

dois actores,

um,  empregado, chamado "Vaso"

em estátua de flores,

o outro,  desempregado, chamado "Jarro"

no chão tombado

em posição que se sente injusta e de pena.

Eu e o outro de mim, sós, espectadores.).

 

Somos irmãos

nascidos ambos dos homens,

as mesmas mãos…

 

Sim, Jarro, irmãos…

 

Tu, irmão,

vaso transparente,

puro o teu coração,

feminina mão te adornando

cobrindo-te de encanto,

vaso florido,

meu bom irmão…

 

E tu, meu irmão,

no chão

deixado por uma qualquer mão

tombado,

meu grande irmão…

 

Ouvi, meu irmão,

uma mão a dizer um dia

que small is beautiful,

talvez seja por isso

o teu bonito ramo de flores...

 

Talvez não, olha que não, meu irmão,

não ouves muita mão falando das sinergias

das grandes fusões, da escala das economias,

do que é grande como diz muita mão?

Tu és grande, se és!, meu irmão,

e não é só o teu tamanho grande,

é no trabalho o teu amplo braço

 

que abarca muita serventia,

muito saber teu

e, olha, essa enorme alegria…

 

Até o teu design

 

Não digas mais, meu irmão…

É ilusão essa alegria!...

Não, não digas, não…

É a vida!..., que o outro dizia...

 

É, irmão,

a vida

no chão…

 

Meu irmão,

que triste o chão

sem ter mão…

 

E amplo o braço…

 

Olha, meu irmão,

eu estou aqui,

dou-te o meu fraterno abraço

e uma minha flor,

é tudo em mim,

talvez te ajude nalguma dor…

 

(Quando o pano baixa

surge um vendilhão numa imagem

de um  centro de terceira idade.

 

Eu levanto-me e saio.

 

O outro continua em silêncio,

triste).


2014-02-13

in José Rodrigues Dias, Poemas daquém e dalém-mar,
178 pp, 2016.

* * *
Jrd, 2020-09-05


sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Lua cheia

 


Lua cheia

 

 

A lua

saiu cheia

à rua

 

e esta noite

continua luz

como o dia.

 

Amar a este luar, porém,

enigma sempre o amor,

místico, outro sabor tem...

 

2015-08-30


in José Rodrigues Dias, Fiat Lux (no ano da Luz), 90 pp, 2015.


* * * 

Jrd, 2020-09-04

quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Reflexão

 


Reflexão

 

  

Que sei de mim?...

De frente, ao espelho, quem sou?...

De quem é o espelho onde me vejo?...

Os dados estão viciados ab initio?...

De quem os olhos meus 

que me vêem?...

É de manhã, o dia a meio, tarde, é já noite?...

E a luz, de onde a luz que me banha?...

Ou a escuridão?...

A luz é filtrada, a preto e branco,

realçando os contrastes,

isenta, pura?...

 

Que sei de mim?...

São os caminhos que faço

que me fazem?...

  

São os caminhos por fazer

que me fazem acontecer?...

 

E pelos caminhos

 

(pelos meus?...

Sim, pelos teus!...),

 

pelos caminhos

o que vai amanhecer?...

 

De lado,

poderão ver-me?...

 

(Ver-me?... 

Sim, ver-te...).

 

Como, ver-me de que lado

se tantos são os meus lados,

  

eu poliédrico,

cristalinamente vago,

eu disperso?...

 

De quem os olhos

que daí me vêem?...

 

Será oásis, miragem,

uma imagem

numa nova caverna?

 

Que sei eu de mim,

que sei de ti,

como cheguei aqui?...

 

Tu, quem és?

 

2016-03-16


in José Rodrigues Dias, Poemas daquém e dalém-mar

178 pp, 2016.

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Jrd, 2020-09-03


quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Santoya

 



Santoya 

 

  

O que se esconde

no fundo desse mar

no teu olhar

onde a luz do meu

se perde devagar

e à pergunta

não responde?

 

E os versos longos

no teu cabelo escritos

quem os reescreveu

assim escorreitos?

Foi depois de uma noite

em que o fruto cedo amadureceu

e o sonho tombou ferido

dos teus lábios?

 

Impotente, quedo-me

nas interrogações dos homens

na decifração dos mistérios

que estão para lá

do que se vê,

como num livro

sobre a lua

doce

no seu recôndito

mais feminino

decerto muito belo

escrito por um poeta ao luar

sem nunca se poder folhear

nem sequer abrir,

apenas vagamente intuir

por algum reverso

de um ou outro verso…

 

2013-11-13


in José Rodrigues Dias, Poemas daquém e dalém-mar

178 pp, 2016.

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Jrd, 2020-09-02


terça-feira, 1 de setembro de 2020

Pergunto ao silêncio

 


Pergunto ao silêncio

 

 

Uma noite de Lua cheia, cheia,

eu, o silêncio audível em leve aragem

e flores viçosas, de viço cheias!

 

As flores que iluminam a Lua,

pergunto eu ao silêncio, olhando o quadro,

ou a Lua que ilumina as flores?

 


José Rodrigues Dias, 2020-09-01