sábado, 5 de setembro de 2020

Vaso com flores

 


Vaso com flores

 

(Sobre um fundo muito negro do palco

um branco frio iluminando à boca da cena

dois actores,

um,  empregado, chamado "Vaso"

em estátua de flores,

o outro,  desempregado, chamado "Jarro"

no chão tombado

em posição que se sente injusta e de pena.

Eu e o outro de mim, sós, espectadores.).

 

Somos irmãos

nascidos ambos dos homens,

as mesmas mãos…

 

Sim, Jarro, irmãos…

 

Tu, irmão,

vaso transparente,

puro o teu coração,

feminina mão te adornando

cobrindo-te de encanto,

vaso florido,

meu bom irmão…

 

E tu, meu irmão,

no chão

deixado por uma qualquer mão

tombado,

meu grande irmão…

 

Ouvi, meu irmão,

uma mão a dizer um dia

que small is beautiful,

talvez seja por isso

o teu bonito ramo de flores...

 

Talvez não, olha que não, meu irmão,

não ouves muita mão falando das sinergias

das grandes fusões, da escala das economias,

do que é grande como diz muita mão?

Tu és grande, se és!, meu irmão,

e não é só o teu tamanho grande,

é no trabalho o teu amplo braço

 

que abarca muita serventia,

muito saber teu

e, olha, essa enorme alegria…

 

Até o teu design

 

Não digas mais, meu irmão…

É ilusão essa alegria!...

Não, não digas, não…

É a vida!..., que o outro dizia...

 

É, irmão,

a vida

no chão…

 

Meu irmão,

que triste o chão

sem ter mão…

 

E amplo o braço…

 

Olha, meu irmão,

eu estou aqui,

dou-te o meu fraterno abraço

e uma minha flor,

é tudo em mim,

talvez te ajude nalguma dor…

 

(Quando o pano baixa

surge um vendilhão numa imagem

de um  centro de terceira idade.

 

Eu levanto-me e saio.

 

O outro continua em silêncio,

triste).


2014-02-13

in José Rodrigues Dias, Poemas daquém e dalém-mar,
178 pp, 2016.

* * *
Jrd, 2020-09-05


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