sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Arado, passado e futuro

 



Arado, passado e futuro

 

 

Mesmo que poucos os passos,

sorte a minha…,

atrás duma parelha jungida

 

e de um arado,

ou de charrua,

 

aqueles seres que então se erguiam

nesse tempo de fazer a sementeira,

e as sementes nem sempre nasciam,

que depois de mil trabalhos floriam,

 

que floriam

em pão

da massa benzida

que as mulheres cedo coziam

de semana a semana, ou mais,

no forno rojo de lenha

  

e que à noite, cansados,

suados, sujos,

os animais acomodados,

 

(que floriam

naquele pão), o pão

 

que os homens na cozinha comiam

à luz duma candeia afugentando as sombras

com umas batatas do pote ao lume

 

e uma espinha de bacalhau

ou uma dentada de toucinho amarelo

em cima dum carolo de pão,

 

ou talvez fosse

um resto de sardinha,

ou nada fosse…

 

Mesmo que poucos os passos,

dizia eu, que sorte, então, a minha!...,

atrás de uma parelha jungida,

 

e de um arado,

ou de charrua,

 

depressa aí percebi,

ainda quase garoto,

 

que só direitos eram meus sulcos

quando perto não olhava

e o destino certo longe eu fixava…

 

Sempre o passado me lembra,

o longe presente sempre, sempre o repito,

que sempre a gente se lembre…

 

2012-09-13


in José Rodrigues Dias, Diário Poético (2012 - 2016), Livro dois, 2/10 (Julho a Dezembro de 2012), 238 pp, 2020.


* * * 

Jrd, 2020-08-28

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